Bissexuais em destaque | “Eu queria heroínas complexas – como eu; defeituosas – como eu; e ainda assim apaixonantes e interessantes”, afirma Giu Domingues

Entrevista Especial Mês do Orgulho Bi

Feminista, bissexual e ansiosa, é dessa forma que a autora Giu Domingues gosta de se descrever. A romancista responsável por “Luzes do Norte” e “Sombras do Sul”, tem encantado as leitoras que são apaixonadas por histórias que envolvam sáficas, magia e fantasia. Em entrevista ao Lesbocine, Giu Domingues compartilha sua jornada de autodescoberta da bissexualidade, discute a importância da representatividade LGBTQIA+ na literatura e destaca o desejo das suas obras terem um impacto positivo na vida das pessoas que as leem.

Reprodução Instagram
Reprodução Instagram

Como foi o processo para entender a sua bissexualidade? Teve alguém na mídia que se tornou referência para você durante esse processo?

O processo foi lento e rápido, gradual e depois todo ao mesmo tempo. Eu sempre soube que tinha atração por mulheres, mas acho que não reconhecia como atração – por vários motivos, mas principalmente por crescer nos anos 2000, que eram MUITO lesbofóbico – e bifóbico. Lembro do beijo da Madonna e da Britney ser chamado de nojento, ou apenas pra agradar homens. Lembro da Ana Carolina sendo chamada de sapatão mesmo tendo estampado a capa de uma revista falando que era bi. Então ,eu não me permitia me entender assim, especialmente depois de entrar em um relacionamento longo com um homem. Mas aos poucos eu fui entendendo que o que eu chamava de “privilégio” era um auto apagamento – e fui encontrando espaços seguros pra me entender.

A bissexualidade em muitos produtos, principalmente no audiovisual, é retratada através de elementos narrativos que percorrem pela confusão, promiscuidade e/ou ambiguidade. Para você, como isso afeta os jovens que estão entendam a sua sexualidade? 

Acho que isso vem por causa de um certo determinismo na identidade sexual – você pode ser isso OU aquilo. Então as pessoas ficam desconfortáveis com identidades como a bissexualidade – e isso gera uma bifobia dos dois lados. Acho que é muito doloroso especialmente pra jovens, que não encontram comunidade em nenhum dos lados e acabam isolados até terem espaços seguros.

Como você mesma se diz: “Escrevo sobre mulheres imperfeitas e mágicas”, o que te motivou a começar a escrever sobre esses romances e histórias?

Eu acho que existe uma tendência na fantasia escrita por homens cis a simplificar a existência de mulheres. Ou são mães que morrem depois de se dedicarem ao herói em posturas de autossacrifício, ou são o interesse romântico que morre pra avançar o enredo… E eu não tinha interesse em nenhuma dessas narrativas. Eu queria heroínas complexas – como eu; defeituosas – como eu; e ainda assim apaixonantes e interessantes.

No momento, você está trabalhando em algum projeto ou, atualmente você tem alguma ideia em particular que gostaria de desenvolver no futuro?

Estou sempre trabalhando em 200 projetos ao mesmo tempo. Atualmente o projeto para o qual estou mais animada é minha releitura sáfica de “O Fantasma da Ópera”! Fechei contrato com a Galera Record para publicá-la e espero poder dar notícias em breve.

Nós últimos anos houve uma crescimento no lançamento de obras voltadas para comunidade LGBTQIA+, como você enxergar o impacto desses livros na nossa comunidade, especialmente na vida de mulheres lésbicas e bissexuais?

Eu fico muito feliz que enfim a indústria esteja vendo a potência de vozes queer, ainda que falte muito trabalho pra gente poder chamar a indústria de diversa. Ainda assim, eu posso dizer que se eu tivesse tido acesso à esse volume de obras em que a sexualidade é diversa talvez meu processo de descoberta tivesse sido menos doloroso e mais fácil – a ficção tem esse poder de abraçar e empoderar, e espero que a minha ficção faça isso com suas leitoras.

Você pode contar para gente mais detalhes sobre o livro “Finalmente 15”? Como surgiu o convite para você participar da lista de 15 autores?

A Galera Record é minha editora do coração e quando a editora chefe, Rafaella Machado, me chamou pra fazer parte da antologia, eu tive que aceitar! Pra mim é especialmente enriquecedor poder estar do lado de pessoas que além de serem meus amigos, eu admiro tanto.

Você tem um contato próximo com os seus leitores, seja pelas redes sociais ou através dos eventos, você pode compartilhar conosco alguma experiência positiva que tenha te marcado?

Cada mensagem, abraço, lágrima, tudo me toca muito profundamente. Quando a gente escreve sente que é algo solitário, mas o ato de contar histórias é incrivelmente humano e comunitário – e eu sinto essa comunidade toda vez que alguém me diz que, por exemplo, teve coragem de sair do armário com o meu livro, ou pediu a namorada em namoro usando um Luzes do Norte… Isso não tem preço.

Se a Duologia Boreal fosse adaptada para um produto audiovisual, quem você queria que estive a frente desse projeto para tornar os filmes ou a série fiel a sua narrativa?

Uma roteirista mulher, como a Bia Crespo – que além de minha amiga pessoal, é lésbica, leitora da duologia e escritora de livros sáficos também!

É perceptível que a literatura trouxe os finais felizes que almejamos, mas como você vê o futuro da representatividade no audiovisual brasileiro? Será que teremos mais histórias leves no futuro?

Eu gostaria que a gente pudesse contar TODO o tipo de histórias – as tristes, as felizes, as com romances, sem romances, as estranhas e as assustadoras. Queria que a gente pudesse sair da caixa que a indústria coloca de “arte LGBT” e pudesse ser simplesmente arte. Pro audiovisual, eu queria ver mais investimento em mídia sáfica, para que ela ganhasse o espaço que merece.

Se você pudesse dar um conselho para si mesma quando estava tentando entender à sua sexualidade, qual seria?

Nenhuma pessoa hétero passa tanto tempo assim pensando em beijar pessoas do mesmo gênero, garota. Se toca e seja feliz <3

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