O último domingo (10) foi dia de ClexaCon virtual, uma versão remota e compacta da ClexaCon. A programação foi composta por uma maratona de painéis sobre histórias e personagens lésbicas e bissexuais.
O Lesbocine marcou presença na convenção e relembra agora alguns dos momentos mais marcantes!
Amalia Holm e Lyne Renée: 3ª temporada de Motherland: Fort Salem e o ship Talder
Um dos painéis mais esperados da ClexaCon virtual foi a mesa com as atrizes Amalia Holm e Lyne Renée, intérpretes de Scylla e General Alder em Motherland: Fort Salem. A terceira (e última!) temporada da produção da Freeform tem estreia prevista para este ano.
E, claro, não poderia ser diferente: boa parte do bate-papo girou em torno das expectativas para o capítulo final da série. Dana Piccoli, mediadora da entrevista, pediu que a dupla definisse os acontecimentos dos novos episódios em três palavras.
Lyne Renée tomou a frente na resposta e escolheu “liberdade”, “amor” e “despertar”. Amalia, que também destacou o quanto os personagens devem se desenvolver e crescer no próximo ciclo da história, adicionou os termos “determinação” e “fúria”.
Outro assunto que entrou na pauta foi um casal queridinho das autoras de fanfic: Talder, formado por Alder e Tally Craven, que é interpretada por Jessica Sutton.
Dana introduziu o tema questionando se Lyne sabia por qual razão tantos fãs compraram a ideia desse relacionamento, ao que a atriz brincou: “Ah, eu sei exatamente o motivo!”.
Renée explicou que até descobrir a existência da ala do fandom que torce para que as duas personagens fiquem juntas, não fazia ideia do que era um ship. Depois que descobriu, no entanto, achou divertido. “Às vezes, você vai trabalhar com alguém e simplesmente tem química, mesmo que não fosse uma interação romântica a princípio. Nunca tinha pensado nelas dessa forma, mas estou feliz em trabalhar com isso”.
Ela também contou que a ideia de alguns toques e olhares partiu dela, incluindo a cena do 8º episódio da segunda temporada, em que há muita tensão sexual entre Talder. Lyne fez as sugestões e a direção adorou.
Bridget Regan: a empolgação com Poison Ivy e a saudade de Jane The Virgin
Outra atriz que fez questão de acrescentar autenticidade a uma personagem icônica foi Bridget Regan, que deu vida à Poison Ivy em três episódios de Batwoman — série que foi descrita logo na abertura do painel como a “mais gay da televisão no momento”.
A convidada destacou que interpretar um nome tão importante para as HQs da DC Comics como a Hera Venenosa foi a “realização de um sonho”, mas também uma responsabilidade que a deixou muito preocupada.
Ela revelou que, em um primeiro momento, a intenção da equipe de direção de arte era propor um figurino sem nenhum tom de verde, e a sugestão a deixou nervosa. Regan só respirou aliviada novamente quando viu que, apesar dos detalhes em vermelho, a cor clássica relacionada a Ivy ainda estava lá, presente nas roupas e maquiagem. “Eu queria honrar os quadrinhos, mas também oferecer uma abordagem original para ela.”
Para Bridget, toda a experiência no set de filmagens foi muito empolgante, tanto pela estrutura, que descreveu como “cinematográfica”, quanto pela sinergia com os colegas de elenco. Sua conexão mais intensa foi, obviamente, com Victoria Cartagena, que interpreta Renee Montoya, de quem Hera é par romântico no universo de Batwoman. “Foi a parceira de cena ideal para criar essa relação tão respeitosa e significativa. A dinâmica delas foi muito bonita e inteligente”, pontuou.
Não foi a primeira vez de Regan como parte de um casal lésbico que conquistou o carinho da audiência. Em Jane The Virgin, também produzida pela CW, ela ficou responsável pelo papel de Rose, posteriormente revelada como grande vilã da série. Seu principal interesse amoroso era a médica Luisa Alver (Yara Martinez).
Em seu painel na ClexaCon, Bridget relembrou a experiência e conversou sobre a importância de termos “supervilões queer” na ficção — personagens que não precisem seguir uma cartilha de bons modos para serem amados pelo público, que consegue se conectar com esses arcos narrativos mesmo quando estão lidando com histórias que fogem ao moralmente correto.
Para a convidada, os sentimentos de Rose por Luisa eram o que possibilitava identificação com ela, mesmo que se tratasse de alguém que cometeu vários crimes graves. “Eu penso que existe uma certa confusão naquela relação que eu gosto, que é verossímil. Você conseguia acreditar porque o coração do relacionamento era um amor genuíno. Rose era uma supervilã, mas Luisa era a kriptonita dela”.
Ainda sem revelar muitos detalhes, a estrela do painel também compartilhou que está filmando uma “comédia romântica queer” em que interpreta um papel secundário.
Na visão de Regan, seu trabalho com tantos personagens da comunidade LGBTQIA+ é apenas uma consequência lógica da maneira como ela sempre enxergou o mundo. A atriz contou que, ainda na adolescência, recrutou um grupo de colegas de escola para organizar protestos pela legalização do casamento entre pessoas do mesmo gênero na Califórnia.
“Às vezes sinto que não estou fazendo o suficiente, e aí preciso me lembrar que nosso papel individual é fazer pequenas coisas todos os dias. Perguntar os pronomes de alguém ou simplesmente demonstrar empatia já faz toda a diferença”, discorreu.
Bethany Brown: representatividade e química entre personagens LGBTQIA+
Bethany Brown, a Ruby W. de Charmed, também focou muito na importância política de se contar histórias que fujam à heteronormatividade.
Ela, que também é parte da comunidade LGBTQIA+, falou sobre como a experiência de interpretar personagens lésbicas ou bissexuais é diferente da composição de uma personagem hétero. “É uma questão interessante porque existem camadas. Não necessariamente impacta a minha sexualidade, mas quando falamos de representatividade, é muito especial e quase sagrado dar vida a personagens queer. Para mim em particular, há um nível de vulnerabilidade e intimidade sexual que me faz colocar muito amor nessas interpretações”.
Brown também defendeu que a conexão com parceiras de cena e a própria autonomia do ator para tomar decisões que não estavam previstas inicialmente são fundamentais nesse processo.
“A química é o elemento mágico e disruptivo que você precisa para tornar uma história crível. Nos roteiros, detalhes como a troca de olhares e outros sinais que são emitidos antes do beijo não estão descritos. Então, é um trabalho que faz toda a diferença”, explicou.
Por fim, na opinião de Bethany, a aptidão dos roteiristas para escrever sob uma ótica progressista é outro ponto indispensável nessa equação. “Às vezes, achamos que uma mulher empoderada precisa ser escrita como se fosse um homem com personalidade forte. Uma personagem feminina pode estar em posições de poder à sua própria maneira e ser sensível sem que isso faça dela menos poderosa”.
Janina Gavankar: os bastidores da escalação da intérprete de Papi, de The L Word.
E falando em criação de personagens, Janina Gavankar esteve na ClexaCon para contar um pouco da jornada criativa de um clássico para a comunidade lésbica: The L Word.
Na série, ela foi Papi, uma conquistadora nata que chegou para agitar a 4ª temporada. A atriz descreveu seu papel como o de uma pessoa “empoderada” com “muita energia sexual”. Como não poderia deixar de ser, a seleção para escolher a intérprete de uma personagem assim precisou refletir essas características.
“A produtora de elenco era uma das pessoas mais bonitas que já vi na vida. No teste, ela e as outras diretoras fizeram algumas perguntas e eu não tive dúvidas, respondi do jeito mais Papi que poderia: falando só as coisas mais sexuais que passaram pela minha cabeça”, contou, aos risos.
No painel, Janina também foi instigada a dizer quem ela achava que fosse a assassina de Jenny, antes do desfecho para o grande mistério da série ser revelado, ao que respondeu: “Eu não pensava muito nisso. É uma coisa horrível de se dizer, mas Papi não se importava o suficiente com ninguém ali. Ela achava todas hipócritas”.
O evento
A ClexaCon é uma convenção de cultura pop voltada ao entretenimento sáfico. O encontro é organizado anualmente desde 2017 como uma resposta à morte de Lexa, personagem da série The 100.
No ano anterior à criação da con, a decisão de encerrar mais um casal de mulheres (Clexa, ship que dá nome ao evento) com um final trágico injustificado e desnecessário deu início a um debate crítico envolvendo público, imprensa e showrunners.
A mobilização questionava a insistência no clichê criativo batizado como bury your gays (ou “enterre seus gays”, em tradução livre), que pune personagens LGBTQIA+ com finais tristes, dramáticos e violentos, ecoando a ideia homofóbica e normativa de que pessoas que fujam a qualquer padrão de gênero ou sexualidade não merecem a felicidade.
A proposta da ClexaCon é expandir a discussão e relembrar a luta constante pela construção de representações lésbicas e bissexuais que sejam saudáveis e coerentes, fugindo dos lugares comuns e agressivos destinados a qualquer personagem que não seja heterossexual.
Por conta da pandemia, o evento tem acontecido de forma virtual. A primeira edição presencial desde 2019 está prevista para agosto deste ano.