A produtora, fundada por Alice Chiappetta e Henrique Osse, chega ao mercado com projetos voltados para a diversidade e o pertencimento nas telas pelo Brasil
Por Vitória Vasconcelos
Para aumentar a representatividade LGBTQIAPN+ no audiovisual brasileiro, a produtora BAHAEZ é oficialmente lançada neste domingo, 13. Criada pelos sócios Alice Chiappetta e Henrique Osse, a empresa anunciou em sua estreia a adaptação de duas obras de literatura contemporânea queer, “Liz Flores É Uma Farsa”, da escritora Vic Mendes, e “Apenas Para Garotas”, de Léo Gumz, além de uma série LGBTQIAPN+ de roteiro inédito criada por Luíza Fazio (“Sintonia”, “Amor da Minha Vida” e “De Volta aos 15”).
Alice e Henrique já trabalham em parceria há três anos no ramo de criação de conteúdo e entretenimento e agora como um novo passo que desejam seguir, a BAHAEZ entra como uma forma de alinhar a carreira de ambos e incentivar obras audiovisuais com diversidade e pertencimento nas telas brasileiras.
A produtora também marcará presença na 34ª edição do Festival Internacional de Curtas do Rio de Janeiro com seu curta-metragem “Mania”. O projeto protagonizado por Clarissa Müller e Sharon Cho, tem roteiro e direção de Malu Alves e venceu a categoria “Melhor Filme de Romance” no festival Los Angeles Movie and Music Video Awards.
Para saber mais sobre a BAHAEZ, o Lesbocine entrevistou um nome da casa sobre a importância de uma produtora voltada para conteúdos e representatividade LGBTQIAPN+. A cineasta sáfica Alice Chiappetta, além de técnica em Artes Cênicas pelo Célia Helena e graduanda em Cinema e Audiovisual pela Escola Superior de Propaganda e Marketing de São Paulo (ESPM-SP) e em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo (USP), é uma das criadoras do Portal Lesbocine.
Durante a entrevista, a cineasta falou sobre a importância do audiovisual para ela enquanto mulher sáfica, sua participação no ramo do cinema, como surgiu a ideia de uma produtora voltada para projetos e para o público LGBTQIAPN+ e deu pequenos spoilers do que está por vir.

Lesbocine: O que o audiovisual significa para você?
Alice Chiappetta: O audiovisual, pra mim, é um lugar de identificação, de encontro e de sonhos. Eu acho que, desde que eu me conheço por gente, eu tinha muita dificuldade de entender quem eu era e de quem eu gostava, principalmente sobre a minha sexualidade, que eu descobri aos 12 anos que eu gostava de meninas.
E o audiovisual e o cinema me ajudaram a entender essa questão. E de me sentir bem com ela em um arredor completamente heteronormativo. Era um lugar onde eu me identificava, onde eu me encontrava, e onde eu percebia que eu conseguiria seguir meus sonhos e viver minha vida e ter minha realidade em um momento que tudo parecia bem difícil para mim.
Então o meu principal objetivo com audiovisual e o que significa para mim é conseguir honrar isso para outras pessoas. Gerar identificação, sonhos e desejos naqueles que assistem as obras que eu crio.
L: Como surgiu o desejo de lançar a sua produtora BAHAEZ? E quais desafios foram enfrentados?
AC: Durante três anos e meio eu trabalhei ao lado do meu sócio, o Henrique Osse, e ele compartilhava desse mesmo desejo que eu: de criar obras LGBT de impacto e que realmente alcançassem o público, mas que o foco não fosse 100% no romance, apesar de existir ou pairar na narrativa de algum modo. Daí foi desafiador sair de um trabalho fixo e uma realidade mais concreta, porque a gente já realizava obras para streams de renome e ir para o mundo do desconhecido, ver o que a gente conseguiria fechar juntos, e então a gente desafiou muito, a gente se desafiou muito num lugar de estar. É isso que a gente quer e a gente vai lutar através de histórias que contem isso.
E a gente já fechou diversas histórias bem legais desde esse momento. Fui diretora de produção do filme “Cinco Júlias”, a gente fez uma série juntos de Drag Queens e também fez diversas obras para o Jão, que é um cantor LGBT, além de outros cantores também queers.
E estamos com adaptações literárias do livro da Vic Mendes, “Liz Flores é uma Farsa”, e da Léo Gumz, “Apenas para Garotas”, além de outras longas metragens com elenco já confirmado, com Giovanna Grigio e Gabi Lisboa. Enfim, obras LGBT que que vão alcançar o público, ou pelo menos a gente pretende. E eu acho que o desafio foi encontrar pessoas que acreditassem e compartilhassem desse sonho para somar junto com a gente no começo da empresa.

L: Você já participou de séries, filmes e até mesmo videoclipes; o que você leva destes trabalhos para sua nova etapa com a produtora?
AC: Eu acho que a principal coisa que a gente leva é muitos contatos bons de parceiros, fornecedores, equipes, players e elenco também. Então, a gente conseguiu rapidamente – no intervalo de seis meses, até menos na realidade – fechar projetos grandes, porque a gente já estava dentro da indústria, que é muito seleta, mas a gente já tinha aflorado nela.
E daí, com isso, também fica mais fácil fazer com que as pessoas acreditem no nosso sonho e cheguem junto. Venham junto com a gente, porque a gente já mostrou resultado e entrega diversas vezes em diferentes projetos.
L: Junto da BAHAEZ, você também anunciou a adaptação das obras “Liz Flores”, de Vic Mendes, e “Apenas para Garotas”, de Léo Gumz; o que podemos esperar das duas obras? Pode dar algum spoiler para a gente?
AC: O que vocês podem esperar das duas obras é que a gente quer conquistar uma narrativa forte junto com uma cinematografia impactante, um pouco mais voltada às entregas para streaming, que é o que a gente costuma trabalhar normalmente. A gente está com uma sala de roteiro de roteiristas premiados, transformando as duas ideias em projetos episódicos e a gente quer focar em fazer uma estrutura transmídia completa, então a gente quer ter uma trilha sonora original, que a gente também conseguiu fazer eventos, shows, álbuns com essas trilhas sonoras, então apenas para garotas, ela menciona, de fato, um álbum da banda, né, e a gente quer transformar todas essas músicas em realidade. A gente também quer que tenha representatividade fora e dentro das telas.
Então a ideia é a gente ter um elenco e uma equipe majoritariamente compostas por mulheres LGBTs, de fato. E a outra coisa que você pode esperar é que essas foram duas das mencionadas, mas tem mais. A gente só não pode falar ainda. Esse é um spoiler, talvez (risos).
L: Você já participou da produção de diferentes obras que possuíam personagens, atores e atrizes, pessoas na produção LGBTQIAPN+. Como uma mulher sáfica, o que isso significa para você?
AC: Quando entrei no audiovisual, eu percebi que na maioria das vezes, as obras sobre mulheres que amam mulheres no Brasil e afora também, não eram feitas por mulheres que amam mulher e isso dava um resultado completamente diferente. Tem narrativas completamente inadequadas às vezes e que poderiam ser mudadas, além de muitas coisas que eu não concordava como pessoa LGBT de estar contribuindo de alguma forma para essas narrativas acontecerem. Então a ideia da produtora é cumprir aquele objetivo que eu contei antes sobre gerar uma identificação verdadeira e real, e é muito importante para mim ter diretoras mulheres, ter atrizes realmente LGBT nos papéis e conseguir fazer entregas que realmente façam sentido com o que a nossa comunidade precisa de uma representatividade positiva e verdadeira.

L: A vida imita a arte e a arte imita a vida; que vivências você leva da sua existência para o set?
AC: Seja quando eu sou produtora ou quando eu sou diretora, o que eu tento trazer muito é a minha formação para além de cinema, mas eu também fui formada em artes cênicas e em ciências sociais e eu sinto que cinema vem muitas vezes de sets de filmagem em lugares agressivos, desrespeitosos, classicistas, elitistas e eu tento ao máximo viabilizar respeito, conversas, carinhos, trocas que não estejam nesses lugares. Inclusive sou muito conhecida por ser uma produtora carinhosa até demais (risos), mas eu acho que é isso, eu acho que a gente consegue fazer um bom trabalho se a gente está num ambiente confortável, num ambiente que a gente se sinta bem e não só em uma constante pressão em que a gente se sinta incapaz.
E eu sempre tento trazer isso pro set de filmagem que eu estou. Nem sempre é possível por fatores alheios, mas é o que eu tento cultivar na minha equipe. E muita escuta também, que são coisas que faltam muito ainda nesse cenário. E que eu sinto que as gerações mais novas pregam muito ainda, que estão cada vez tentando mudar isso.
Foto em destaque: Fraga/@fdefraga