Por Marina Fiorani
A CCXP se auto-intitula o maior festival de cultura pop do mundo, reunindo cerca de 300 mil participantes até o último dia de evento, na edição de 2025. Contando co
m fãs de todo tipo de conteúdo, como quadrinhos ocidentais, séries, filmes, mangás, animes e games, a CCXP levou adultos e crianças a quatro dias de euforia em palcos e ativações surpreendentes; mas uma parcela considerável do público geral voltou para casa com suas expectativas frustradas.
Os brados de meninos e homens durante o painel da Crunchyroll eram ouvidos de muito longe do Palco Thunder, na manhã de sábado. O ator Timothée Chalamet, protagonista de “Marty Supreme”, também comoveu a multidão uma noite antes, assim como o elenco de “The Boys”, trazido como destaque pela Prime Video. E o que dizer sobre o painel da Disney+, que levou fãs de todas as idades às lágrimas com as estrelas de “Percy Jackson e os Olimpianos” e “Paradise”? De fato, foram dias inesquecíveis para quem consome conteúdo geek e pop: homens e mulheres apaixonados se viram rodeados por seus interesses em todas as direções em que olhassem, realizando sonhos e vivendo momentos emocionantes.
Já a comunidade sáfica encontrou um cenário completamente diferente. Se a CCXP tem como missão fazer seu público se sentir pertencente e se identificar em meio a pessoas com as mesmas paixões, as atrações falharam indubitavelmente em fazer mulheres lésbicas e bissexuais se enxergarem e se sentirem representadas no evento. Num momento em que tanto se tem discutido sobre trazer protagonismo para mulheres que amam mulheres no audiovisual, a comunidade LBT+ foi novamente colocada de escanteio em mídias digitais e offline.
O romance entre mulheres foi ignorado de forma lastimável num festival de tamanha proporção. A indústria audiovisual trouxe diversas produções com representatividade sáfica positiva em 2025, cativando milhares de fãs que romperam barreiras linguísticas para consumir conteúdos que traduzissem suas vivências; mas ainda assim, os palcos principais e ativações de um dos maiores festivais geek/pop do mundo não deram destaque para nenhuma narrativa sáfica em quatro dias de evento. O cenário para a representatividade, apesar dos consideráveis avanços nos últimos anos, abre espaço para críticas e indignações que já são velhas conhecidas entre as mulheres sáficas: nos deparamos, mais uma vez, com nossas histórias sendo retratadas de forma quase que imperceptível em narrativas paralelas ou, pior, deixadas de lado completamente.
Os poucos ambientes em que mulheres lésbicas e bissexuais poderiam encontrar identificação se escondiam no Artists’ Valley, a área reservada para que artistas independentes pudessem expor e vender suas obras. Ao redor das mesas, as expositoras comentaram que a produção da CCXP realmente teve preocupação com a diversidade ao reservar esse espaço para muitos artistas pertencentes a diversas minorias, conforme o compromisso assumido pelo evento em seu próprio site; mas que ainda era uma realidade muito distante do ideal. As bancas que expunham uma variedade de prints, bottoms e adesivos celebrando o amor entre mulheres faziam sucesso entre o público, mas também jogaram luz à revolta da comunidade com o desinteresse da indústria geek perante ao público LBT+.
Diante desse cenário, coloca-se mais uma vez em pauta uma discussão que já é antiga: os grandes nomes do mercado realmente se importam com dar voz e destaque à diversidade, ou as causas das minorias só se tornam relevantes quando estão entre os assuntos mais comentados do momento? Em um ano marcado por tantos ships e conteúdos sáficos que tiveram repercussão fervorosa em âmbito internacional, é questionável que eventos de grande porte e com tamanho prestígio ainda tratem os interesses das mulheres LBT+ com um descaso tão perceptível.